Entrevista com © Dra Olga Inês Tessari
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Amadurecer é processo contínuo
Sempre é tempo para crescer.
Mas chega um momento da vida que não dá mais para ter atitudes infantis ou enxergar os fatos somente pela ótica do "nosso mundinho". Amadurecer dói. Amadurecer significa ter de abandonar utopias e encarar a realidade como ela é, muitas vezes mais fria e racional do que gostaríamos. Mas amadurecer tem suas vantagens. Quando aprendemos a simplificar as coisas e ver seu verdadeiro valor, a vida se torna mais prazerosa, mais gostosa de ser vivida.
Na reportagem especial de hoje, a repórter Renata Fernandes entrevistou a psicóloga Olga Tessari, de São Paulo, autora do livro "Dirija sua vida sem medo". Ela fala sobre os obstáculos que enfrentamos para amadurecer e o quanto essa guinada na vida pode nos ajudar a ser mais felizes. E para quem acha que já amadureceu o suficiente, vai um recado: a vida é feita de constantes transformações, por isso invista no auto-conhecimento e aprenda algo novo todos os dias.
RAIO X
Olga Inês Tessari, psicóloga e psicoterapeuta desde 1984, escritora, palestrante, pesquisadora e consultora. É autora do livro "Dirija a sua vida sem medo" (editora Letras Jurídicas) e mantém o site www.ajudaemocional.com, desde 2001, com mais de 10 milhões de visitas (dados de maio/2007). Ela atende casos desde a infância até a terceira idade e atua nas áreas de ansiedade, auto-estima, medos, timidez, pânico, estresse, depressão, orientação de pais, de casais, dificuldades e problemas nos relacionamentos em geral (afetivos, sociais), distúrbios da alimentação (compulsão, obesidade, anorexia, bulimia) e sexualidade.
A idade cronológica das pessoas nem sempre coincide com a emocional. É mais comum, inclusive, a maturidade física chegar antes. Muitos adultos mantêm atitudes infantis diante das circunstâncias da vida. Assim como há jovens precocemente maduros. É humanamente impossível controlar absolutamente todas as emoções, mas é bastante viável ter domínio sob muitas delas. Para isso é preciso crescer. Para crescer é necessário se conhecer, se amar, ter tolerância e, principalmente, saber lidar com frustrações.
O psicoterapeuta Flávio Gikovate afirma que o primeiro passo para a felicidade sentimental está em aprender a ficar razoavelmente bem sozinho. "Isso só ocorre com maturidade emocional, que se caracteriza pela capacidade de suportarmos bem as dores da vida."
Segundo ele, é preciso se desenvolver emocionalmente até atingir uma maturidade que permita competência para lidar com frustrações. "A felicidade sentimental é a recompensa acessível a todos os que completarem o ciclo mínimo de evolução emocional."
A psicóloga de São Paulo, Olga Inês Tessari, autora do livro "Dirija a sua vida sem medo" (editora Letras Jurídicas), explica melhor o que é maturidade emocional na entrevista que segue abaixo:
Bem-Estar - O que é maturidade emocional e a que está relacionada?
Olga Tessari - Maturidade emocional é a habilidade que a pessoa tem de se relacionar com outras da melhor forma possível para si mesma. É evitar que problemas pessoais interfiram no desempenho profissional. É a capacidade de ver a vida por um ângulo mais positivo. É ser simpático com os outros mesmo diante de contrariedades. É a aceitação de si mesmo. É ter respeito para consigo e com os outros. É ser paciente, objetivo e ter capacidade de lidar com adversidades sem se deixar abater totalmente. Sem se indignar ou sofrer sem motivos suficientes e reais. É conhecer os próprios limites e respeitar os dos demais. É saber fazer escolhas e arcar com as conseqüências delas. A pessoa emocionalmente madura tem bom domínio sobre as próprias emoções e é capaz de rir de si mesma, por conta de seu bom senso de humor. A maturidade emocional também é aceitar a responsabilidade pelas conseqüências de seus atos, tomar decisões baseadas em critérios e valores pessoais, ter independência financeira, ser menos egoísta e ter mais consideração pelos outros.
Bem- Estar - Por que emocionalmente muitos adultos não acompanham sua idade cronológica?
Olga Tessari - Há pessoas que passam a vida toda numa eterna infância/adolescência porque a base da maturidade é a capacidade de tolerar a frustração. Algo que a criança aprende com o passar do tempo: nasce egoísta e com sensação de onipotência, uma vez que, na barriga da mãe sempre tem todas suas necessidades satisfeitas; mas, na medida em que cresce, percebe que nem tudo é como ela gostaria, nem sempre suas necessidades e desejos são satisfeitos. Infelizmente, muitos pais mimam demais os filhos, o que os leva a crescer com a falsa sensação de que podem tudo o que desejam e isso os impede de chegar à maturidade emocional, mesmo adultos na idade cronológica. Pesquisas revelam que nem mesmo o fato da pessoa concluir uma faculdade ou casar e ter filhos é garantia de maturidade emocional, pois esta é definida não pela passagem por eventos tradicionais adultos, mas pela mudança na personalidade e no comportamento.
Bem-Estar - Há como saber qual nossa "idade emocional"?
Olga Tessari - Existem fases distintas na vida de uma pessoa: a infância, a adolescência e a vida adulta, época em que se supõe chegar à maturidade emocional. Uma pessoa infantil é aquela que age no sentido de ter todas suas necessidades satisfeitas e que não lida com a frustração de forma alguma. É o caso da criança que chora e faz escândalo quando não consegue o que quer. A adolescência é uma fase intermediária, em que o jovem aprende que nem tudo é como gostaria, mas ainda tem alguns acessos infantis quando é contrariado. O adulto, por sua vez, é aquele que tem a capacidade de tolerar a frustração, pois ela permite distinguir a fantasia da realidade, ou seja, discernir o que é possível ou não de se conseguir. Além disso, na maturidade emocional a pessoa sabe perdoar e ser humilde para reconhecer seus erros, dificuldades e rir de si mesmo.
Bem-Estar - O que faz com que algumas pessoas sejam mais maduras que outras?
Olga Tessari - Em geral, quanto mais experiências de vida a pessoa possui mais possibilidades de amadurecer tem, desde que saiba aprender com cada uma das experiências vividas. Portanto, não é quantidade de experiências que necessariamente determina a maturidade de uma pessoa, mas a forma como encara e vive cada uma delas. Uma pessoa pode simplesmente encará-las com sofrimento, culpa e não extrair delas o aprendizado e o amadurecimento necessário. Preferem se penitenciar por vivenciá-las ou ter atitude de reclamar, chorar e se lamuriar. A construção da maturidade emocional está relacionada à educação familiar, ao fato de ensinar o filho a saber cuidar de si mesmo desde pequeno, respeitando suas limitações, sob pena de transformá-lo num adulto inseguro e imaturo. Elogiar cada acerto e não simplesmente criticar cada erro faz com que a criança amadureça mais rapidamente.
Bem-Estar - É possível ter atitudes maduras em determinadas áreas da vida, como na financeira ou profissional, e ser imaturo em outras, como na familiar e afetiva? O que é mais comum acontecer?
Olga Tessari - Sim, porque são áreas diferentes da vida que requerem aprendizado único em cada uma delas. Em outras palavras, cada uma dessas áreas precisa de uma vivência e experiência específica para que a pessoa chegue à maturidade. É comum a pessoa ser madura na área financeira ou profissional porque são áreas em que há objetividade, em que a pessoa deve executar sua tarefa e ponto. Não há muitos sentimentos envolvidos e o sucesso depende exclusivamente do próprio empenho e esforço. Na área familiar e afetiva, ao contrário, existe uma dependência do desejo do outro, em que o que se quer está condicionado ao outro e nem sempre o outro é capaz de corresponder à sua expectativa ou deseja ceder e satisfazer seu desejo e anseio. E é nessas áreas que observamos se a pessoa tem maturidade emocional ou não, justamente porque quem é maduro é capaz de lidar com o "não" sem fazer drama ou se sentir prejudicado, sabendo respeitar a decisão do outro. É óbvio que a pessoa vai ficar triste por não ver seu desejo satisfeito, mas não deixará sua vida de lado, muito menos paralisar diante disso.
Bem-Estar - Qual a importância da maturidade emocional para o desenvolvimento espiritual?
Olga Tessari - Se você fala de religião, devo dizer que a questão espiritual é algo de competência de cada pessoa de acordo com sua educação, valores e hábitos de vida, não necessariamente ligada à maturidade emocional. Agora, se você fala no sentido da pessoa buscar respostas para o vazio existencial ("de onde vim, para onde vou"), uma pessoa madura lida muito melhor com essas dúvidas do que a imatura, que prefere seguir uma determinada religião sem questioná-la, acreditando nela piamente.
Bem-Estar - Como a pessoa pode se avaliar quanto a sua maturidade emocional? Quem é imaturo consegue perceber isso? Há como mudar?
Olga Tessari - Uma pessoa imatura, em geral, não tem consciência da sua imaturidade. Pelo contrário, muitas vezes age no sentido de tentar provar para outras pessoas que é madura. Mas, na medida em que se relaciona com as pessoas, em um determinado momento ela sente uma necessidade de modificar seu comportamento para evitar o sofrimento que advém de sua própria imaturidade. Muitas pessoas tentam, em vão, atingir o estado de maturidade e só vão encontrá-lo por meio de tratamento psicológico. Vale dizer que o tratamento psicológico é o caminho para atingir a maturidade mais rapidamente porque a pessoa passa a conhecer seus próprios limites, aprende a respeitar a si mesma e aos demais sem criar muitas expectativas irreais com relação aos outros.
Bem-Estar - Quais as vantagens e desvantagens em ter maturidade emocional?
Olga Tessari - Não vejo desvantagens em ter maturidade emocional, pelo contrário, uma pessoa madura encara de forma positiva seus erros e acertos, sabe lidar bem com as dificuldades da vida e tira proveito de todas as situações que vivencia, encarando-as como um aprendizado de vida. Uma pessoa madura é equilibrada emocionalmente, não se deixa levar por suas emoções, sabe lidar bem com as críticas, com seus próprios erros e nunca foge das responsabilidades de seus atos.
Bem-Estar - Como lidar com quem não tem maturidade emocional? E quem costuma ter mais maturidade emocional: o homem ou a mulher? De que isso depende?
Olga Tessari - Infelizmente os homens têm menos maturidade emocional pela própria educação machista que a mulher ainda mantém ao criar seus filhos. A maioria cria os filhos para ser dependentes da mulher. Tanto que um homem dificilmente consegue viver sozinho e ser auto suficiente. Geralmente, é dependente da esposa, mãe, ou na falta delas, de uma empregada para cuidar dele. Por outro lado, em geral, os homens são muito mais maduros do que as mulheres na área do trabalho, até porque são lançados nele mais precocemente: é a própria necessidade de sustento que os leva ao amadurecimento emocional na área profissional. Mas, vale dizer que a própria educação familiar faz a mulher crescer com a consciência de que é frágil e dependente do homem. Mas, aos poucos, esta situação está mudando e os pais têm percebido a necessidade de educar seus filhos para o mundo, para se tornarem auto-suficientes, para aprenderem a lidar com as frustrações e assumir a conseqüência de seus atos.
Bem-Estar - Pode dar algumas dicas para as pessoas crescerem emocionalmente?
Olga Tessari - Procurar manter contato com o maior número de pessoas, de culturas e hábitos diferentes, viajar, interagir e, se possível, com o maior número de grupos diferentes. Para os pais, ensinar seus filhos desde pequenos a respeitar o próximo, a valorizar cada acerto de seus filhos e não exigir deles aquilo que eles ainda não são capazes de fazer por conta do limite de idade e capacidade. Ensinar que errar faz parte da vida e que é possível aprender com eles e não se culpar. A culpa impede que a pessoa aprenda com o seu erro. E para os adultos a dica é aprender que cada pessoa é como é e que nada do que fizermos ou deixarmos de fazer vai mudá-la ou fazer com que ela corresponda às nossas expectativas, se ela não quiser. Por último, se colocar no lugar do outro e seguir aquele ditado popular que diz mais ou menos assim: "Não faça para o outro aquilo que você não gostaria que fizessem com você".
Matéria publicada no Diário de São José do Rio Preto - Caderno Bem Estar por Renata Fernandes em 26/07/2007
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