Olga Tessari

Jogos eletrônicos e violência

Entrevista com © Dra Olga Inês Tessari

*Veja indicação de outros textos para leitura ou vídeos no final da página

Será verdade que os jogos geram violência? 

Algum tempo atrás escrevi um artigo sobre esse assunto para uma coluna antiga em um velho site. Mas como fui incapaz de achar este artigo, e levando em conta que a mídia como um todo, bem como o mundo, mudou de lá para cá, resolvi fazer uma reciclagem sobre o tema. 

Após muita leitura, eis que cheguei a conclusão que já mantinha sustentada anteriormente. Jogos eletrônicos violentos não induzem a violência, nem podem causar de forma linear a violência social, problema que assola nosso mundo. 

Alguns pontos chaves levantados em minha pesquisa sugerem essa conclusão, passo agora a analisar cada um deles. Não pretendo com isso fechar completamente essa discussão, nem de forma alguma afirmar que meu conhecimento possa ser comparado ao de um psicólogo, psiquiatra ou qualquer forma de profissional que se dedica inteiramente a esse assunto ou seus relacionados. 

Estou escrevendo este pequeno texto como se eu fosse uma ponte. Uma ponte entre os adolescentes, que jogam tais jogos, e esses profissionais, que foram criados em diferentes épocas, diversas daquela do público que esta mídia (jogos eletrônicos) alcança. 

Eu sou da "geração do meio". Aquela que jogou quando criança, e joga agora, e no entanto está com a mente evoluída o suficiente para encarar criticamente tal assunto. 

Primeiramente, vamos analisar exatamente o conceito de gerações. A geração "assolada pela terrível praga dos jogos eletrônicos violentos" está definindo seu futuro a cada instante. Nossas crianças e adolescentes simplesmente estão escrevendo sua própria história, enquanto que aqueles que criticam tais diversões eletrônicas geralmente passaram por uma geração que não se viu no meio dessa revolução da mídia. Como podem pessoas que nunca tiveram contato com esse meio analisar criticamente esta situação? Com podem saber os efeitos destes jogos na mente dos que os jogam se nunca foram expostos? Nem são capazes na verdade de analisar esta situação, pois reduzem os jogos ao que subjetivamente acham ser a "correta maneira de se aproveitar o tempo de uma criança" como cheguei a ler em um artigo. 

O futuro muda senhores, e com ele, comportamentos e paradigmas. 

Para analisar esta realidade, é necessário mais do que apenas estudos e opiniões individuais baseadas na realidade que se tem como padrão. É necessário imergir nesta realidade com imparcialidade e maleabilidade, abrir a mente. Então, considero tais noções, subjetivas e vazias, inúteis. Perdoem-me os psicólogos, psiquiatras, analistas, políticos, moralistas, mães e pais, protetores das crianças e adolescentes em geral, e seus afins. Sua opinião neste assunto é irrelevante. 

Agora, outro aspecto. O conceito de violência. Violência está em todo lugar, faz parte, tanto da natureza humana como da cultura popular. Quer ter uma amostra de violência pura, estude história. Nosso passado foi escrito a ferro e fogo, e sangue. Um tapinha na bunda de seu filho pode ser considerado violência, assim como adentrar uma sala de aula com uma automática vitimando indiscriminadamente. 

O fato é que violência é muito mais uma "muleta" para descrever atos repulsivos aos olhos da maioria do que um conceito definido. Além disso, as fronteiras de significado de palavras e atos vivem mudando, mudam com a própria evolução da raça humana. Basta notar que cumprimento meus amigos hoje com um aperto de mão quase absurdamente forte, e que quanto maior o "estalo" proveniente do choque das mãos, maior o apreço tido com o indivíduo. Tome em conta que chamo jocosamente alguns de meus melhores amigos de "lixo", e nem por isso sou considerado menos por eles. Pelo contrário. Então, "mandar chumbo" em alguns dos meus melhores amigos virtualmente pela Internet seria o ultimato da violência, afinal, quando a mensagem "Você matou com um tiro na cabeça com a Colt 47 em uma distância de 47 metros", eu teria perdido a amizade... Ou no mínimo esperaria uma vingança, e isso não ocorre. 

Agora chego no terceiro ponto. Até que ponto ambientes simulados podem afetar o desenvolvimento psíquico dos jovens e adultos? 

Em um brilhante texto, uma psicóloga explica que na verdade ambientes simulados trazem muito mais vantagens que desvantagens. As complicações aparecem quando o comportamento dos jogos é refletido na realidade. Ela atribui diretamente ao ambiente real da criança a capacidade ou não de ser influenciada por um ambiente simulado como jogos eletrônicos. A família e o círculo social são os "espelhos" de uma jovem mente. E se tais espelhos não fornecem de forma satisfatória um modelo, aí sim a criança PODE vir a externar atos do ambiente simulado na vida real. Isso aconteceria muito cedo na verdade, na formação da criança, ainda mais hoje em dia, quando tais jovens estão muito mais cedo expostos a todo tipo de informação do mundo adulto. 

Cito: "A criança emocionalmente saudável brinca com o jogo por um tempo, mas logo se cansa. Os jogos não interferem na sua vida real nem nos seus compromissos com a família, com a escola e com os amiguinhos. Para estas crianças é apenas um jogo, que até pode estimular determinadas brincadeiras, mas nada além disso. Crianças que se tornam viciadas em jogos eletrônicos revelam que algo não vai bem com elas, pois são impacientes, ansiosas e buscam no jogo uma satisfação que não tem dentro de si mesmas" (Olga Tessari) 

Então não é o JOGO o problema. Ele apenas revela que algo está errado com aquela pessoa. 

Isto me remete diretamente ao próximo ponto. A indústria da mídia aposta pesado na violência. Ela está presente nos filmes, jogos, diversões em geral, esportes, notícias. O que chama a atenção vende, e o que vende é produzido, não temos como fugir disso. De algum tempo para cá, as formas de acesso ao entretenimento, bem como a faixa etária exposta ao mesmo mudaram. As crianças e jovens cada vez mais cedo tem acesso a tais mídias, pela Internet, TV, plataformas de entretenimento (vídeo-game), etc. A violência está em tudo, e nem sempre uma crítica acompanha ela, como uma lição de moral dos antigos contos de fadas nos quais a bruxa envenena a princesa, ou o lobo come a vovozinha. Na verdade, mesmo os mais infantis desenhos e séries possuem traços de violência. Tomo como exemplo "Tom e Jerry", em que pauladas e dor são mostrados sem parar. Mesmo o "Chaves", tão querido, apresenta espancamento de crianças e violência em vários aspectos. O fato é, não tem como fugir disso, nem como envolver os pequenos seres humanos em um escudo contra tais informações. De fato, isso teria na verdade um efeito destrutivo, pois isolaria e provocaria mais desilusão quando enfrentar a realidade fosse necessário. 

Segundo o presidente da Abrinq, Sinésio Batista: A arma de brinquedo não prejudica ninguém, pois a criança brinca com o imaginário, com o lúdico, sendo que a violência não faria parte desse contexto. Ninguém é bandido por isso. É só uma forma de extravasar a violência. Se alguém quer ser contra que seja contra os filmes com aquelas armas loucas que as crianças tanto gostam. 

Segundo pesquisa da Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos (Abrinq), entrevistas feitas no antigo complexo penitenciário do Carandiru com os presos de maior periculosidade, nenhum afirmou brincar com armas de brinquedo quando criança. Mesmo assim, já faz anos que a Abrinq não fabrica mais esse tipo de brinquedo. "Nós tiramos de linha porque foi tanto problema na imprensa isso". 

Agora, continuando com uma citação da Olga (adorei essa mulher): A psicóloga Olga Tessari corrobora a tese de que os jogos, em geral, têm essa função de descarregar as energias armazenadas, além de estimular o raciocínio, a criatividade, a atenção, a memória, a coordenação motora fina e a estratégia. "Antigamente as crianças brincavam entre si com lutas, espadas improvisadas, corridas, mocinho e bandido ao vivo, na rua com coleguinhas. Como hoje em dia o espaço para as brincadeiras com coleguinhas tem se limitado cada vez mais, a criança busca no jogo uma alternativa para estas brincadeiras e para 'descarregar' a sua energia típica", opina. 

Segundo a psicóloga, os jogos eletrônicos não levam o ser humano, independente de ser uma criança ou um adulto, a praticar um crime algum dia, o mesmo vale para aqueles que nunca jogaram, que podem, um dia, fazer algum ato que atente contra a humanidade. Isso porque, como ela destaca, trata-se de uma questão de valores éticos e morais formados pela família ou pelo meio no qual a pessoa está inserida. "O que pode acontecer, com a prática indiscriminada dos jogos eletrônicos aliado ao sensacionalismo televisivo e à falta de valores da família, é a banalização da violência, pois as pessoas passariam a encará-la de uma forma comum, tornando-se menos sensíveis a situações que antes causavam indignação ou constrangimento. Mas, para que isto ocorra, é preciso que a criança esteja no seio de uma família onde os valores éticos e morais não sejam bem definidos ou o relacionamento familiar não seja coeso", finaliza a psicóloga. 

Por outro lado, me deparei com artigos ridículos, falando sobre "dessensibilização", sobre a origem dos jogos como sendo "a partir de treinamentos para soldados". Até estava ficando assustado com o artigo, até ler esse trecho: Em minhas palestras contra TV, jogos eletrônicos e computadores na educação, muitas vezes me perguntam: se a influência da TV e dos jogos eletrônicos é tão maléfica por que não ocorrem muito mais casos de assassínios como, por exemplo, o da escola Columbine, da cidade de Littleton, que foi objeto de documentário cinematográfico? Nesse caso, os dois jovens assassinos e suicidas claramente prepararam-se treinando em jogos eletrônicos. Minha explicação é que a educação e uma resistência natural à agressividade ainda devem ser as responsáveis pela contenção do condicionamento feito pelos jogos violentos. Isto é, ainda bem que o ser humano tem uma relativa proteção contra ser violento; mas, certamente, a TV e os jogos produzem um aumento na agressividade, como já foi provado em experimentos cientificamente controlados. 

Contra TV, jogos eletrônicos e computadores?! Minha nossa, e o artigo deste cara está na Internet, ele deve ser um hermitão. Está cientificamente comprovado o CONTRÁRIO. Que o ser humano, primitivamente e primordialmente, como todo animal, tem tendências violentas (vide primeiros parágrafos, história humana), e na verdade é a SOCIEDADE, a FAMÍLIA e os tão aclamados FREIOS INIBITÓRIOS que nos tornam capazes de refrear tais instintos, e não lutar por comida ou parceiros sexuais (apesar que se hoje em dia você sair em uma boate vai notar que basta um pouco de bebida para estes "freios" sumirem e o macharedo se atracar no laço por mulher). 

A violência sempre existiu e sempre vai existir, mil vezes "soltar" esse perigoso sentimento em um ambiente virtual até cansar, do que sair concretizando isto na realidade. Cito Disturbed (pela enésima vez) em uma música sobre a qual o vocalista e compositor comenta que acha mil vezes melhor, e necessário, que seus fãs venham aos shows, gritar como loucos e extravasar esta violência, do que sair se espancando. 

Agora, o último aspecto. O que este tipo de jogo pode trazer de bom? 

Vou enumerar para não me perder: 

1. Melhora coordenação motora fina. 

2. Melhora a visão espacial, noção de espaço. 

3. Cria ligações sinápticas, melhora o raciocínio. 

4. Força o cérebro, ativando áreas que cuidam da lógica, estratégia e visão. 

5. Cria relações sociais (clãs, times, parcerias). 

6. É uma diversão segura. 

7. Estimula seguir regras e obedecer limites. 

8. Estimula a curiosidade. 

9. Permite explorar ambientes distantes, permite experiências diversas.  

10. Estimula o aprendizado, leitura, novas línguas. 

Vou parar por aqui. Acho que provei meu ponto. 

* O g33k4u (Geek For You) é um repositório de pensamentos e artigos que escrevo ao longo do tempo. Coletâneas de filosofia, Direito, Tecnologia da Informação e um pouco de diarréia mental, só prá dar um gostinho. Alguém tá afim de jogar? 

Matéria publicada no blog g33k4u (Geek For You) por Daniel 26 anos - Santo Ângelo - RS em 26/04/2007

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